Simão Assunção avalia sistema defensivo do SC Corinthians

Simão Assunção, auxiliar técnico de futsal no FK Nikars da Letônia, analisou o processo defensivo do SC Corinthians. Apresentou de forma simples e objectiva como se defende cada vez mais na Europa e fez uma breve comparação entre os dois processos.

De Portugal: Este breve artigo tem o objectivo de dar a conhecer ao futsal brasileiro o conceito de organização defensiva que é utilizado pelos principais clubes e seleções europeias – defesa à zona. Consiste em defender espaços, e não jogadores. A referência é a bola. Uma frase que traduz bem este método é: “Todos contra a bola”. É um método defensivo que tem algumas desvantagens, pois necessita de uma grande consciência táctica e é difícil defender perto da baliza adversária. Porém , o desgaste físico é muito menor, favorece o contra-ataque, a equipa faz menos faltas, o jogador com bola está constantemente vigiado, a ocupação do espaço é muito equilibrada e, consequentemente, os espaços são fechados de forma mais eficaz.

Porém, a marcação individual pode ser muito útil, mas apenas em situações muito específicas. Por exemplo, em organização defensiva, executar pressão alta com marcação individual, nos últimos minutos do jogo, quando a equipa está a perder. Para as transições defensivas e esquemas tácticos defensivos a marcação individual também se encaixa muito bem, mas também para situações muito específicas. Mas isso veremos mais adiante. As Figuras 1 e 2 mostram o conceito de linhas defensivas. Perto da baliza adversária defende-se com três linhas. Com o bloco defensivo baixo, com duas linhas.

Pressão - Linhas Defensivas

            Figura 1.

Defesa Baixa - Linhas Defensivas

            Figura 2.

Vejamos de forma mais objetiva como se executam os três momentos defensivos – organização defensiva, transições defensivas e esquemas tácticos defensivos (também conhecidos, na gíria, por “bola parada”).

Através dos esquemas animados, pode-se constatar que a preocupação, nos três momentos defensivos, é a oposição à bola, ocupando o espaço o mais racional e equilibradamente possível.

Vejamos o primeiro momento defensivo: organização defensiva perto da baliza adversária. Toda a movimentação/rotação das linhas defensivas é a mesma, independentemente das movimentações dos adversários: seja paralela, diagonal, combinação directa (tabela), entre outros. (Abrir RotacaoDefensiva e ir clicando). O mesmo acontece quando se defende mais baixo. (Abrir Rotacao Defensiva – Defsa Baixa e ir clicando).

Dentro da organização defensiva, existe outro momento específico, que é 5 x 4 defensivo. Aparentemente, a equipa está em inferioridade numérica. Mesmo considerando que está, essa é mais uma razão para que a equipa se preocupe com a ocupação racional do espaço. Porém, mais uma vez, tem uma situação muito específica, na qual a marcação individual é uma excelente solução – quando o adversário joga com apoio interior (Abrir 5×4 Defensivo e ir clicando).

Quanto ao segundo momento defensivo – transições defensivas – este tende mais para a marcação individual, pois acontecem em poucos segundos, mas também em situações muito particulares. (Abrir Transições Defensivas e ir clicando).

Por fim, em relação ao terceiro momento – esquemas tácticos defensivos – os princípios orientadores são os mesmos. Primeiro, a equipa tem de fechar o espaço central. Este é o espaço mais perigoso, pois é frontal à baliza e o mais propício para haver golo. Depois do primeiro passe acontecer, é aí que a equipa passa de defesa à zona para defesa individual. Ou seja, fecha-se o espaço mais perigoso, e depois exerce-se uma forte pressão na tentativa de recuperar a posse de bola (Abrir Esquemas Tacticos Defensivos e ir clicando).

Agora, passemos a analisar o processo defensivo do SC Corinthians. E porquê o SC Corinthians? Porque é uma equipa com jogadores que têm qualidade acima da média e quando chega às decisões competitivas, não ganha. Esse passo que o SC Corinthians tem que dar para a frente, passa por uma alteração do método defensivo. Então, façamos a ligação entre o conceito da defesa à zona e o método defensivo utilizado no SC Corinthians.

No vídeo 1 (Princípios Específicos da Defesa), tem três exemplos dos dois primeiros princípios específicos da defesa. Contenção – 1º princípio específico; Cobertura Defensiva – 2º princípio específico. O primeiro exemplo é sobre a Contenção e os outros dois sobre a Cobertura.

Vendo o primeiro exemplo, quando o Grémio se encontra a desenvolver o ataque perto da linha do meio-campo, a pressão sobre a bola é praticamente nula. Pressão forte cria crise de raciocínio ao portador da bola. No segundo, na parte final da jogada, Rafa pressiona portador da bola e ninguém faz cobertura defensiva (2º princípio específico). Caso Rafa seja driblado, o adversário isola-se. Caires, como último homem, está no lado contrário à bola, marcando o adversário. Estes aspectos de ocupação racional do espaço estão limitados no processo defensivo do SC Corinthians. Não pela falta de qualidade técnico-táctica dos jogadores, mas sim porque o método defensivo e a marcação individual. No quarto e último exemplo, quando Bruno (última linha defensiva) pressiona o portador da bola, a 2ªlinha – Betão – deve deslocar-se para o interior do campo, executando a cobertura defensiva. Se o adversário directo de Bruno rodar para a baliza, ficará isolado. Nesta jogada, a cobertura impediria a sequência da jogada, pois o Fernando vem atrasado no acompanhamento do seu adversário directo.

Agora, vejamos no vídeo 2 (Ações 1ª linha), ações específicas da 1ªlinha defensiva do SC Corinthians. São vários exemplos. Uns mostram o que vai ao encontro do conceito de defesa à zona e outros, o contrário. Basicamente, é mostrado que quando a 1ªlinha permanece no seu espaço, cria dificuldades de construção ao ataque do adversário. Quando um jogador da 1ªlinha acompanha o seu adversário directo, abre espaço para que ele consiga jogar.

Quanto ao vídeo 3 (Ação 2ªlinha), é exibido apenas um exemplo da uma ação da 2ªlinha que, segundo a defesa à zona, não deve ser executada. É notória a preocupação com o jogador, e não com a ocupação do espaço. Aquela ação desprotege a ala, ficando um adversário isolado.

O vídeo 4 (Ação 3ª linha) mostra apenas uma ação da 3ª linha. Uma vez mais, preocupação exclusiva com o adversário e não com a bola e/ou espaço.

Passando para o vídeo 5 (Defesa Zona – global): trata-se de uma análise às rotações defensivas gerais, independentemente das ações do adversário, tal como foi explicado no início do artigo. Um exemplo de como não fazer e os outros dois certíssimos, tendo em conta a defesa à zona.

Vídeo 6 (5×4 Defensivo): Os dois primeiros exemplos são quase perfeitos. Porém, chamada de atenção para o exemplo seguinte. Há uma mistura de defesa individual com zona. Schumacher marca individualmente o apoio interior do Yoka. Se a bola entra no jogador da linha de fundo, é Schumacher quem irá fazer oposição. Aí, o jogador que ele está a marcar individualmente no meio, ficará isolado. Equipa deve estar compacta, fechando espaços interiores. 1ªlinha deve estar muito activa e agressiva, para interceptar um eventual passe para esse apoio interior. Caso a bola entre nesse apoio vinda do meio, Schumacher pode ir pressionar. Caso a bola entre no apoio vinda da ala, deve ser um elemento da 1ªlinha a pressionar, como fez Rafa no primeiro exemplo. Analisando agora as transições defensivas, é um momento muito importante no jogo de futsal. Provavelmente, o mais importante. Por várias razões. Primeiro, porque é necessária uma mudança de atitude ofensiva para defensiva, ou seja, mudança rápida do “chip” no cérebro dos jogadores. Depois, muitas vezes, é preciso fazer um sprint de 20 a 25 metros. Exige muito sacrifício por parte dos jogadores. Numa fase inicial de cada transição, a preocupação deve ser a ocupação do espaço. Pouco depois, sim, parte-se para a marcação individual.

No vídeo 7 (Transições Defensivas), estão três exemplos. Primeira transição: Betão tenta fechar a linha de passe. É uma ação defensiva importantíssima, mas que deve ser feita progressivamente até perto dos 10 metros defensivos, pois Betão é o último homem no momento da perda de bola. Ele deve ir recuando, dando tempo para que os seus companheiros recuperem o seu espaço. Valeu a ação do GR, pois Alex não teve tempo de interceptar o passe. Segunda transição: preocupemo-nos, mais uma vez, com a bola e com o espaço. Último homem do SC Corinthians é Douglas. Este está em ótima posição para controlar as ações do portador da bola. Rafa e Fernando devem sprintar simplesmente para trás…para o espaço…de forma a que fiquem 3 jogadores perto da baliza. Além disso, Douglas, sendo o último homem, nunca deve arriscar o desarme daquela forma, naquela zona. Terceira transição: O resultado é 7 – 0 neste momento. Numa transição defensiva, os que estão atrás da linha da bola devem correr o máximo que puderem para tentar criar superioridade numérica defensiva. Neste caso, Charuto deve sprintar em linha recta. Bruno poderá pressionar mais cedo o homem com bola e Charuto evitaria o passe para o jogador que remata.

Finalmente, os esquemas tácticos defensivos (“bola parada”). Quer em cantos, foras, ou livres, o objectivo é fechar o espaço interior. No vídeo 8 (Esquemas Tácticos Defensivos), podemos ver que nos cantos e nos foras defensivos do SC Corinthians, várias vezes, o espaço interior está desprotegido. Às vezes, 1ª linha está muito larga, por vezes a 2ª e 3ª linha marcam individualmente, antes do primeiro passe. Outras vezes, o posicionamento é em 2:2, o que desprotege o espaço interior. Outro pormenor a ter em conta é o facto de, por vezes, haver demora na reorganização defensiva após a bola sair. Assim, o SC Corinthians é apanhado de surpresa.

Um facto que está mais do que consumado, é que o futsal do Brasil é dos melhores do mundo, a par do espanhol, russo, italiano. Porém, tudo na vida pode ser melhorado. O Brasil é um país que, no âmbito desportivo, pode ser o melhor do mundo em tudo. No caso do futsal, o jogador brasileiro é talento puro. Parece que o jogador brasileiro nasceu para jogar futebol e futsal. Tecnicamente muito evoluído. Capacidades físicas também bastante evoluídas, essencialmente a velocidade e explosividade. Então, se houver uma melhoria táctica em relação ao processo defensivo, o futsal brasileiro será, sem dúvida, o melhor do mundo. Outra frase que tem aparecido nos últimos anos nas modalidades desportivas colectivas diz: “O ataque ganha jogos, e a defesa ganha campeonatos!”

Foto: UEFA

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.